Outras Protagonistas

Outras Protagonistas

Rosarita Fleury
Da religião às artes, não faltou abnegação feminina na consolidação da capital que nascia no Cerrado

Irmãs Agostinianas
Em junho de 1937, quatro irmãs da ordem das Agostinianas Missionárias chegaram a Goiânia para fundar um colégio, um dos primeiros construídos na área destinada à nova capital. Na Rua 55, no antigo Bairro Popular, elas receberam um terreno do então prefeito Venerando de Freitas Borges para construir a unidade educacional. A ordem, que já existia em Catalão desde os anos 1920, veio a Goiânia também para participar da implementação dos serviços da Santa Casa de Misericórdia, então em construção por iniciativa da primeira-dama, dona Gercina Borges Teixeira.

O colégio, com 81 anos de existência, sempre funcionou no mesmo lugar em Goiânia, situado na região próxima do Parque Mutirama. As missionárias que vieram para o Brasil saíram da Espanha, onde o núcleo missionário das irmãs agostinianas foi fundado, em 1890. As freiras espanholas pioneiras no Brasil foram as madres Esperança Garrido (que dá nome ao teatro que foi construído nas dependências do Santo Agostinho), Natividade Gorrochátegui, Paz Hernandez, Mercedez Inarte, Isidora Rodriguez, Juliana Benito, Maria Valvanera, Angels Franco e Inês Lopes.

Celenita Amaral Turchi
Foi uma das primeiras professoras universitárias de Goiás a conquistar destaque na docência. Nos anos 1960, poucas mulheres conseguiam perseverar no ambiente acadêmico, mas Celenita conseguiu mais que isso. Casada desde 1951 com o também professor Egídio Turchi, um dos fundadores da Universidade Federal de Goiás e Universidade Católica de Goiás, pavimentou seu próprio caminho, sendo uma das primeiras mulheres de Goiás a defender uma tese de doutorado. Seu trabalho, desenvolvido na Universidade de São Paulo, foi supervisionado por dois gigantes dos estudos literários, os professores Antonio Candido e Alfredo Bosi. As filhas de Celenita também trilharam carreiras de sucesso. Uma delas, Maria Zaira Turchi, preside a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado Goiás (Fapeg). Outra, a médica Celina Turchi, ganhou destaque internacional ao descobrir a associação entre crianças nascidas com microcefalia e o vírus da zika. Por esse trabalho, em 2016 foi considerada uma das cientistas mais importantes do mundo.

Belkiss Spenciere
Nasceu em uma família de grande talento para a música – sua avó, Nhanhá do Couto, liderava os saraus na cidade de Goiás – e obteve a melhor formação possível na área. Por isso, transformou-se em uma das musicistas brasileiras com mais prestígio dentro do País e também no exterior. Isso não a fez cuidar apenas da própria carreira. Pelo contrário, foi uma das que mais trabalharam para a instalação de um conservatório de música em Goiânia, gênese de um dos cursos que formariam o primeiro núcleo da Universidade Federal de Goiás. Ela também ficou marcada por ser uma das personalidades que mais hipotecavam apoio a atividades culturais, nos mais variados nichos, em Goiânia por décadas, além de ter contribuído para a formação de centenas de talentos.

Na educação e nas artes, com teatro a literatura, mulheres encontraram caminho alternativo a 
uma política predominantemente masculina

Marieta Teles Machado 
Foi uma das autoras mais importantes do Estado e fez de Goiânia um polo de criação de literatura infanto-juvenil, o que permanece ainda hoje. Apesar de ter morrido muito jovem, com apenas 52 anos de idade, deixou um grande legado para gerações posteriores de leitores e escritores. Também coube a ela trazer para Goiânia uma nova visão sobre a importância das bibliotecas. Incumbida pelo fundador da UFG, professor Colemar Natal e Silva, de organizar os acervos da nova universidade, ela foi uma espécie de precursora nesta área por aqui. Ela teve ainda relevante participação no cenário teatral goiano com seu trabalho de dramaturga.

Eva Todor
Sua companhia de artes cênicas, chamada Eva e Seus Artistas, foram as escolhidas para, em junho de 1942, inaugurar o palco do Cineteatro Goiânia, uma pérola de inspiração art dèco erguido no coração da nova capital e um dos símbolos maiores do Batismo Cultural da cidade. O texto encenado foi Colégio Interno, de Ladislau Fodor, dramaturgo que era tio da atriz. 

A direção do espetáculo coube ao marido de Eva, o teatrólogo Luiz Iglesias. A trupe se espantou com a beleza do edifício situado em uma região, naquele tempo, ainda muito isolada. Eva Todor ficou conhecida do grande público por seus papéis em telenovelas, sobretudo na Rede Globo. Nascida em Budapeste, na Hungria, chegou ao Brasil quando tinha apenas 10 anos de idade.

Maria do Rosário Cassimiro
Carrega o título de ter sido a primeira mulher a ocupar o cargo de reitora de uma universidade federal em todo o Brasil. Em 1981, ela assumiu o cargo na Universidade Federal de Goiás, depois de ter passado por cargos como a de pró-reitora de Extensão e diretora da Faculdade de Educação da instituição, onde lecionou. Ela dirigiu a UFG até 1985. Com a criação do Tocantins, na Constituição de 1988, uma universidade federal também foi criada para o novo Estado e coube a Maria do Rosário a tarefa de coordenar essa primeira fase de estruturação, também assumindo o posto de reitora por lá.
Mariana Paula: pioneiro na jornalismo
Primeira colunista social de O POPULAR narrou o cotidiano de uma cidade em nascimento

Os sobrenomes eram famosos. Naquele tempo, anunciar-se como uma Fleury Curado significava abrir portas, ser recebida nos círculos mais exclusivos, ter uma rica história familiar para contar. E Mariana Augusta soube como poucas fazer valer seu prestígio. Sua irmã, Maria Paula, enveredava pelo jornalismo há algum tempo quando Mariana iniciou sua carreira nos primórdios do jornal O POPULAR, logo que ele foi fundado em Goiânia, em abril de 1938. Inauguraria um espaço com as notícias da sociedade, onde também publicaria suas crônicas, com registros únicos da época.

Maria Paula, a primogênita, e Mariana, mais nova, eram filhas da escritora Augusta de Faro Fleury Curado, que na transição entre os séculos 19 e 20, publicava memórias e textos autobiográficos, muitos deles considerados de vanguarda por sinalizarem a defesa da autonomia feminina. Em sua dissertação de Mestrado chamada Fora da Vida: As Mulheres da Família Fleury, defendida na Universidade de Brasília (UnB), Rafaella Sudário Ribeiro afirma que as obras das mulheres da família tornaram-se também importantes como trabalhos de cunho historiográfico. 

Essa atuação inspirou, primeiramente, Maria Paula, que começou a colaborar, nas décadas de 1910 e 1920, em jornais como O Lar (que passou a circular na cidade de Goiás em 1926) e Lavoura e Comércio (publicado em Uberaba), além da Revista Feminina, de São Paulo, às vezes assinando com pseudônimo feminino (Marilda Paulinia), às vezes masculino (Danilo). Era um tempo em que mulheres no jornalismo era uma novidade. Ainda mais duas irmãs. Mariana Augusta, conhecida como Nita, veio para Goiânia em seus primórdios, junto com uma imprensa também nascente.

Entre 1938 e 1952, Nita foi titular da coluna Do Meu Cantinho, em que lançava um olhar peculiar sobre eventos que a nova capital abrigava, personalidades que aqui começaram a habitar, locais que se tornariam importantes. Nita estava sempre nas recepções do Palácio das Esmeraldas recém-construído, nos clubes onde a alta sociedade da novíssima sede do poder estadual se reunia e, de certa forma, traçava os destinos daquele canteiro de obras cujo destino era se transformar em uma das maiores cidades do País.

Mariana também escreveu contos e breves novelas. Parte de sua produção literária foi reunida em um livro que levou o nome de sua coluna, Do Meu Cantinho, publicado em 1984. Além de O POPULAR, colaborou com outros títulos importantes, como a revista Oeste. Ela notabilizou-se ainda por seu trabalho filantrópico como socorrista de guerra e na direção da Legião Brasileira de Assistência (LBA), sucedendo no cargo a ex-primeira-dama Gercina Borges. Pela escrita pioneira da jornalista que morreu em 1986, aos 89 anos de idade, passou Goiânia e seu nascimento.

Amália Hermano foi um dos nomes mais relevantes da cena cultural goiana por décadas, apoiando diversas iniciativas e fazendo de sua casa, que ficava na Rua 24, no Centro, um ponto de encontro de artistas de Goiás e de renome nacional. Uma de suas atuações mais destacadas foi durante o 1º Congresso Nacional de Intelectuais de 1954, quando ajudou a articular a vinda de celebridades literárias e recebeu convidados muito especiais para o evento. Amiga próxima do casal de escritores Jorge Amado e Zélia Gattai, Amália conheceu naquela oportunidade o poeta chileno Pablo Neruda, que veio a Goiânia prestigiar o encontro. Ela lhe presenteou um pássaro, que depois ele incluiu em um de seus poemas. Essa ligação com a natureza também foi uma marca de Amália Hermano, que era historiadora. Ela ficou conhecida por cultivar lindas orquídeas e lutar em prol de causas ambientais. Em sua homenagem, o Jardim Botânico de Goiânia leva o seu nome.
 
Regina Lacerda é considerada um dos mais importantes nomes dos estudos em folclore em Goiás. Autora de estudos fundamentais para a área, ajudou a fundar instituições que se tornaram referência na defesa desta bandeira, como a Comissão Goiana do Folclore. Teve ainda participação ativa no 1º Congresso Nacional de Intelectuais, realizado em Goiânia em 1954. Em toda a sua vida, desde quando ainda era bem jovem, Regina Lacerda imprimiu no que fez sua marca de pioneirismo. Deve-se a ela boa parte dos trabalhos de recuperação de patrimônios materiais e imateriais, incluindo as informações que recolhia em livros que chegaram a ser publicados pelo Ministério da Educação e distribuídos em todo o Brasil. Nascida na Cidade de Goiás, Regina dividia-se entre a antiga e a nova capital, estabelecendo esta ponte entre as duas localidades e fazendo com que o antigo e que deveria ser preservado com o novo e que deveria ser divulgado.

Expediente

Edição Multiplataforma
Silvana Bittencout, Fabrício Cardoso, Rodrigo Alves e Michel Victor Queiroz

Reportagem
Rogério Borges

Edição de fotografia
Weimer Carvalho

Arte
André Luiz Rodrigues

Design
Marco Aurélio Soares

Audiovisual
Carmem Curti
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