Iris Rezende

O goiano dos goianos

A vida de Iris Rezende é marcada por vitórias e derrotas, mas nunca por ostracismo.

Relembre a história do político que cativou multidões

Texto: Rogério Borges

Nos anos 1960, um jovem prefeito ganhou destaque nacional com um regime de trabalho diferente em suas obras. Ele reunia uma multidão e fazia com que todo mundo pegasse no pesado. Os mutirões levaram Iris Rezende Machado, então com cerca de 30 anos de idade, a se transformar em uma das mais influentes lideranças políticas do Estado. “Quando os militares me cassaram em 1969, eu já estava com a campanha para governador na rua. A eleição seria no ano seguinte e eu já tinha até slogan: ‘Bom Pra 70’”, recorda ele, ocupando o mesmo cargo em que estava 50 anos atrás.

Com uma energia incomum em um homem de 84 anos de idade, Iris Rezende relembra em detalhes um passado que se confunde com a história de Goiás no último meio século. Governador em dois mandatos, prefeito de Goiânia em quatro oportunidades, senador, ministro de Estado em dois governos diferentes, homem que já despertou paixões e ódios, suas vivências são detalhadas com gestos largos, inflexões na voz e frases de efeito. “Quando fui governador, asfaltei quase 5 vezes mais estradas que todos os outros que me antecederam. Fiz as máquinas roncarem.”

A carreira política de Iris Rezende é marcada por vitórias e derrotas, mas nunca por ostracismo. Seu maior hiato na vida pública foram os 10 anos em que teve seus direitos políticos cassados, entre 1969 e 1979. “Eles não tinham motivos. Eu não era dado a subversão. O ato causou incômodo até nos meios militares”, confidencia. Formado em Direito, Iris dedicou-se nesse período à advocacia, atuando constantemente em tribunais de júri, onde sua verve não passou despercebida. “Eu convidei dois desembargadores que haviam sido aposentados pelo golpe para montarmos o escritório.”


Iris afirma que sua gestão na Prefeitura de Goiânia fixou-se no imaginário do eleitor. “Fui cassado dois dias antes de inaugurar o Parque Mutirama. Também íamos inaugurar a Praça do Avião, mas não deu tempo.” Quando as eleições diretas para governador retornaram, Iris já havia recuperado o direito de concorrer e o sonho adiado em 1970 pôde se concretizar. “Eu ganhei e fiz 80% dos prefeitos, dos deputados estaduais e federais e os senadores. Ninguém esperava isso.” A força do PMDB que pedia a redemocratização em Goiás teria outro efeito, este no âmbito nacional.


“Um dia, o telefone tocou e era o doutor Ulysses Guimarães. E ele me informou que o partido decidira apoiar uma emenda constitucional que previa a volta da eleição direta para presidente e precisava de um lugar para começar a mobilização popular. Outros governadores já haviam declinado e ele quis saber se eu poderia fazer isso aqui em Goiás”, lembra. “Topei na hora. Foi um risco calculado. Era a primeira vez que um governador, no regime militar, patrocinava um ato dessa natureza. Eu poderia perder o cargo ou ser cassado de novo. Ainda vivíamos a ditadura”, enfatiza.

Não só aquele comício foi feito, como um outro, quando Tancredo Neves e todas as lideranças que apoiavam sua eleição para o Planalto vieram a Goiânia. Filho do dono de uma olaria na pequena Cristianópolis, menino criado na roça e que chegou a Goiânia com 15 anos de idade, Iris teve um percurso improvável. “Nove anos depois de chegar, fui eleito vereador no mesmo pleito que Jaime Câmara era eleito prefeito.” A relação com um dos fundadores de O POPULAR, em sua avaliação, foi fundamental. “Jaime Câmara foi uma das pessoas que me deram norte na vida pública.” Norte que precisou ser reencontrado após a surpreendente derrota para o governo em 1998. Iris precisou se reerguer, depois de perder também uma vaga no Senado em 2002, voltando às origens, à Prefeitura de Goiânia, em 2004. Desde então foram três mandatos. E em sua sala, não faltava um tradicional pão de queijo. “Ele é feito com leite das vacas da raça gir que crio em Guapó. É uma beleza”, garante. “Sei fazer tudo na roça, de tirar leite a manejar machado, a ferramenta mais exigente que tem.” Não duvidem da destreza de Iris Rezende, com o machado ou com a política.


O último prosear com Iris

O POPULAR circulou pela capital acompanhado de Iris Rezende após o então prefeito anunciar a aposentadoria

Marcos Nunes Carreiro

marcos.carreiro@opopular.com.br


“Pra mim é um prazer, uai. Político anda longe pra dar motivo de notícia, e vocês querem escrever de mim no jornal. Mas depois seleciona, né? Porque eu gosto de brincar também. Eu sempre falo: é preciso levar a vida um pouco na brincadeira.”

Foi assim que Iris Rezende começou uma das últimas entrevistas exclusivas que concedeu ao POPULAR, já no fim de seu quarto mandato como prefeito de Goiânia. Era 9 de dezembro de 2020 e passava pouco das 8h, quando entramos em uma van com o objetivo de andar pela cidade e ver a capital sob o seu olhar.


Iris dizia ter uma relação de simbiose com a cidade. Tanto que nasceram no mesmo ano: 1933, sendo o município de 24 de outubro e ele de 22 de dezembro. Em 2021, Goiânia completou seus 88 anos; Iris, não. O político com a carreira mais longeva da história de Goiás morreu nesta madrugada  depois de ficar três meses e três dias internado em decorrência de um AVC sofrido em 6 de agosto. Naquele dia, Iris estava em seu escritório político, na Avenida T-9, onde “batia ponto” sempre que estava em Goiânia. Passou mal no local, enquanto recebia aliados políticos e empresários, e foi amparado pelas filhas Ana Paula e Adriana, que o levaram ao hospital.

Sua presença no escritório demonstrava que Iris continuava trabalhando, apesar de aposentado, uma característica que herdou do pai, Filostro Carneiro Machado. “Papai cuidava de três, quatro fazendas”, contou Iris no dia em que conversamos. “Ele saía de casa segunda (feira) cedo e não aceitava que peão aplicasse uma vacina em bezerro. Era ele”, disse de maneira enfática e fazendo o gesto da vacina com as mãos. Filostro morreu em 1991, aos 84 anos. Quatro anos antes, também tinha sofrido um AVC.


Iris chegou a Goiânia em 1949 vindo de Cristianópolis, onde nasceu, e aqui se tornou conhecido pelo movimento estudantil do qual participou, partindo daí para ocupar, pelas urnas, as principais cadeiras nos espaços políticos de Goiás ao longo de 62 anos. Foi eleito o vereador mais votado da capital no pleito de 1958 e, em 1962, trocou a Câmara Municipal pela Assembleia Legislativa.

Em 1965, assumiu a prefeitura, vencendo Juca Ludovico, então apoiado pelos militares, que, via golpe, tomaram o controle do País um ano antes. Porém, cumpriu apenas três anos do mandato, pois foi cassado em 1969 e só voltou à vida pública em 1982, eleito governador — recuperou os direitos políticos em 1979.


A história do dia em que foi cassado estava no rol das muitas que ele gostava de contar. Morava no Setor Campinas à época, bairro tradicional da capital, e no qual residia desde que havia chegado com a família, 20 anos antes. “Foi tudo inesperado. Era uma sexta-feira. Só cassavam (mandatos) na sexta-feira pra não dar tempo do pessoal fazer movimento. A cidade toda veio pra minha casa, ficou aquele tumulto”, relembrava Iris.


Contou aquela história muitas vezes à imprensa, algumas delas acompanhado de pão-de-queijo, quitanda que gostava de servir em encontros. Certa vez, em 2012, Iris chamou a imprensa ao apartamento onde morava na época, no Setor Oeste, para explicar acusações feitas contra ele. Tinha deixado o mandato da prefeitura dois anos antes para disputar o governo do estado. Depois da coletiva, mandou trazer a bacia de pão-de-queijo. Achou que não daria para todo mundo, e mandou fazer mais.


Mas a casa onde ocorreu a concentração de pessoas naquele 1969 era a que foi morar após se casar, em Campinas. Iris, por ironia do destino, se casou com mulher de mesmo nome, mas sobrenome Araújo, a conhecida Dona Iris, e no dia de seu aniversário: 22 de dezembro. A união se deu em 1964, um ano antes de vencer a eleição para prefeito de Goiânia.


O tempo que passou sem direitos políticos foi dedicado à advocacia, profissão na qual nunca havia atuado. “Tinha o diploma, mas não tinha experiência”, dizia. Mas tinha contatos e isso já bastava para começar. A década que passou advogando lhe propiciou, segundo ele, “a oportunidade de fazer a vida, ganhar dinheiro.” Alegava que foi daí que conseguiu comprar suas fazendas.


Uma delas, a de Canarana (MT), era seu “refúgio”. Passou lá boa parte do tempo entre janeiro e agosto de 2021. Era sua outra profissão, dizia, algo que o “capacitou”, por exemplo, a ser ministro da Agricultura durante o governo de José Sarney — depois foi senador e voltou a ser ministro, desta vez da Justiça, no governo de Fernando Henrique Cardoso.


Em entrevista ao Jornal do Campo, em maio deste ano, Iris disse: “Eu vivi praticamente até os 15 anos de idade na roça, de forma que tudo o que você possa imaginar de serviço grosseiro de roça eu sei fazer”. A matéria deixa clara ainda outra característica de Iris: o gosto de demonstrar que, apesar de idade, ainda tinha força física.


Um dos takes da reportagem, feito com um drone, o mostra, por exemplo, subindo numa porteira. A cena me fez lembrar de outra, ocorrida em 2017, durante o então tradicional desfile de 7 de setembro. As autoridades estavam em um palco de metal na Avenida Tocantins, a quase dois metros do chão, cujo acesso era por uma escada.


Enquanto os outros políticos, todos na faixa de 40, 50 anos, subiam amparados pelo corrimão, Iris, à época com 83, subia sem encostar na estrutura, e rápido. “Ele gosta de mostrar que sua força física está intacta. Ele faz esteira todo dia, sabia?”, disse-me uma auxiliar na ocasião.


Eu sabia e, por isso, naquele 9 de dezembro de 2020, perguntei a ele se ainda mantinha a rotina de exercícios. Ele respondeu que fazia a sua “ginástica” no prédio onde passou a morar, a poucos metros de seu escritório político, no Setor Marista. “Tem lá uma sala de exercícios e eu tinha o meu técnico para auxiliar nas ginásticas diárias.”


Ressalta, entretanto, que o personal não pôde mais entrar no prédio devido à pandemia de Covid-19, declarada em março daquele ano. “O síndico decidiu proibir a entrada de pessoas estranhas no prédio e, consequentemente, o personal ficou impossibilitado de entrar. Mas eu sempre gosto de praticar exercícios. O corpo humano está a exigir, de cada um, exercícios permanentes.”


Exercitava-se pela manhã, antes do horário comercial. “Quer dizer, eu nunca levantei depois das 5 horas da manhã. Toda vida.” Hábito adquirido da infância passada na fazenda em Cristianópolis. Filostro Machado acostumou os filhos a acordarem ainda de madrugada para trabalhar na lida rural. Saiu da roça, mas os hábitos ficaram. “A gente tem um tempo pra pensar, pra refletir, pra decidir. Chega num determinado momento do dia, que você não tem”, dizia.


Iris praticamente não viajava quando estava exercendo algum mandato, nem para suas fazendas em Britânia (GO) e no Mato Grosso, ou mesmo para conhecer políticas públicas desenvolvidas em outros lugares e que pudessem ser aplicadas em seus governos.

“Eu conheço o mundo inteiro. Já saí com a família (em) algumas viagens. Mas acontece que, quando eu pego o poder, não posso viajar porque centralizo, uai. Como viajo, se aqui em Goiânia, pra comprar um parafuso, tem que ter a minha autorização? Não posso”, disse, enquanto estava parado debaixo de uma árvore no Parque Mutirama.


Ironicamente, o Mutirama foi criado depois de uma viagem que Iris fez aos Estados Unidos, a convite do governo americano, na década de 1960. Visitou a Disneylândia, ficou encantado com o que chamou de “brinquedos monumentais” e decidiu implantar algo do tipo na capital goiana. Em escala muito menor, obviamente.


Conversar durante deslocamentos era coisa rara para Iris, me disseram auxiliares. Gostava de observar a cidade e ver se tinha algo errado. No trajeto de 2 horas e 40 minutos que fizemos no fim de 2020, ele interrompeu a conversa algumas vezes para indicar algo que precisava ser resolvido a um auxiliar que nos acompanhava: “Olha o tanto de lixo ali”; “Olha o buraco aí”; “Viu o outro buraquinho aqui?”.


Era obcecado pelo trabalho, agora encerrado. Que descanse em paz.



Próximo do povo, centralizador e tocador de obras

Perfil Líder regional atento às demandas da população de baixa renda, a qual envolveu em mutirões,

mas também criticado como “cacique” que barrava caminho a outros líderes, destacam analistas

Karla Jaime

karla.jaime@opopular.com.br

Quais traços e ações mais marcantes na trajetória de Iris Rezende Machado ajudam a definir sua importância como liderança política em Goiás e no Brasil? Dois cientistas políticos, Itami Campos, doutor em Ciência Política pela USP, professor titular da UFG, aposentado, e Pedro Célio Alves Borges, sociólogo, professor aposentado na FCS/UFG., fazem, a pedido do POPULAR, um resumo dessa história. Eles falam da atuação e qualidades que levaram o governador em dois mandatos, prefeito de Goiânia em quatro oportunidades, senador e ministro de Estado em dois governos diferentes a despedir-se da política cercado de homenagens e reconhecimento. Também comentam críticas feitas por ex-aliados, adversários e mesmo inimigos, que o consideravam populista, coronel, cacique, acusando-o de barrar outros líderes, até em seu próprio partido, o MDB, ao qual permaneceu fiel ao longo de quase toda sua carreira política.

Qualidades e ações como líder

Itami Campos – Destaca-se a forma como se relacionava com pessoas simples, do povo, carroceiros e outros segmentos populares. Embora político conservador, procurava atender às demandas da população de baixa renda. Os mutirões foram uma estratégia utilizada de fazer política, como forma de fazer a população participar, de se envolver com o setor em que residia, de procurar melhorar a condição do setor/bairro. Muitos mutirões e em diferentes setores foram realizados e um deles resultou em um bairro residencial, a Vila Redenção, em 1963, a partir de construção de casa populares, com ruas abertas, tornando-se, posteriormente, bairro bem estruturado. Essas atividades desenvolvidas como prefeito em Goiânia, retomando posteriormente como governador, procurando fazer ‘vilas populares’ em diferentes cidades do Estado de Goiás. Assim surge a Vila Mutirão, em 1983, com mil casas construídas e em região pobre que faz surgir outros locais de residência popular. Destaque-se que também setores nobres da cidade mereceram sempre atenção, com muitas obras, viadutos, praças, asfaltos. A sua vinculação com obras e empresas de construção marcam os diferentes momentos de gestão administrativa, prefeitura e governo.


Pedro Célio - Iris Rezende se dedicou com intensidade à política. Desde o início da carreira, fez da luta pelo poder a prioridade na ocupação de seu tempo. Dormia pouco, levantava muito cedo para obter mais rendimentos em conversas, reuniões, negociações e elaboração de estratégias para as disputas nas quais se lançava. Além disso, desenvolveu cedo uma habilidade incomum para fugir de posições conceitualmente extremas. Essa foi sua marca na época da ditadura, quando ele conviveu muito bem com os militares, mesmo sendo da oposição. Era hábil para articular e conciliar interesses divergentes. Outra qualidade política de Iris esteve na acuidade para conduzir a administração pública, em geral nos momentos de recursos escassos. Em várias ocasiões ele mostrou competência para efetuar obras marcantes com pouca disponibilidade orçamentária e sob a vigilância ferrenha dos órgãos de controle. Nesse plano, poucos alcançaram o êxito que ele obteve.

Semelhanças com outros grandes líderes

Itami Campos - Cito Pedro Ludovico. Ele, Iris, inicialmente filiado ao PTB, elege-se vereador (1958) em Goiânia; depois, filia-se ao PSD e torna-se aliado de Pedro Ludovico. Deputado estadual (1963-1967) foi líder do governador Mauro Borges (1962-1965), filho de Pedro Ludovico. Depois, deputado estadual e presidente da Alego, levou à votação o ato de intervenção federal em Goiás (novembro/1965), também a eleição do interventor federal. Com o bipartidarismo, no Regime Militar (1964-1985), filia-se ao MDB. Consta ter sido convidado por militares a filiar-se à Arena, não atendeu. Com a redemocratização, tornou-se o principal político regional do MDB/PMDB. Deixou marcas de sua atuação, especialmente em Goiânia.


Pedro Célio – Em relação a líderes “nacionais”, eu acho que não. É no plano regional que Iris faz-se um político proeminente e dominante, exceto em momentos localizados e de pouca duração, como no intervalo de 1983 a 1985 (da democratização, das “Diretas já!”), em que ele adquire projeção para além das fronteiras estaduais. Mesmo quando foi titular dos Ministérios da Agricultura e da Justiça, o seu protagonismo nacional ficou limitado. Durante um bom tempo eu adotei a “hipótese da síndrome de periferia” para tentar entender essa dificuldade de Iris. Trata-se de um determinismo que tem matriz na frágil importância regional de Goiás (e seus representantes), pois o Estado sofre o peso de entrar com parcos 3% nos parâmetros mais decisivos em questões nacionais: participação no PIB nacional; no eleitorado do país; na representação na Câmara dos Deputados; etc. Devo dizer que hoje eu vejo vários exemplos que não me deixam mais advogar a tal síndrome de periferia. Veja que Petrônio Portela era do Piauí e Teotônio Vilela de Alagoas. Olhando 2021, Randolfe Rodrigues, Simone Tebet, Omar Aziz e Renan Calheiros são do Amapá, Mato Grosso, Amazonas e Alagoas, respectivamente. Quer dizer, há políticos que conseguem furar o bloqueio de serem oriundos de bases pouco expressivas por meio por meio de outros atributos, e tornarem-se relevantes em polêmicas fundamentais ao país, por longos períodos. Isso é, são políticos que, além de manter controles de máquinas eleitorais locais, são também formuladores políticos perante a opinião pública e as demais forças.

Antes e depois da ditadura militar

Itami Campos - Na ditadura militar, prefeito (1966-1969), sucedendo ao udenista Hélio de Brito, mudou a cidade. Reformou a prefeitura, construindo um prédio simples que abrigava todas as secretarias e economizava gastos com alugueis; fez operação de recuperação de asfaltos, tapa-buracos; mutirões para melhorar a condição de moradia na periferia da cidade; ganhou projeção no Estado e também nacional. Foi cassado pelo AI-5 em 17 de outubro de 1969. Governador, mantém a administração voltada à construção de estrada, construção de casas populares, de certo modo, atendendo às demandas populares. Mantém-se popular, populista.


Pedro Célio - Separar o período da ditadura do pós-ditadura pode ser um critério interessante para qualificar a evolução política de Iris. Eu nunca enquadrei dessa maneira. Só acho que do ponto de vista de uma periodização, cabe inserir o ano de 1998, pela grande inflexão provocada em sua carreira pela inesperada derrota para Marconi Perillo. Mas, para Iris, o período do regime militar pode corresponder ao “tempo da lembrança”, que assenta as origens da formação mítica, especialmente porque durante dez anos anteriores à anistia de 1979, a imagem de Iris foi a de vítima do arbítrio, do jovem líder injustamente excluído da vida pública, do qual só se ouviam relatos de dor e sofrimento na luta pela sobrevivência. Aí se criou a narrativa do herói que voltaria para vencer e a opressão e reparar as injustiças. Depois, o retorno à política preenche o “tempo da presença”, com as lutas pelo fim da ditadura ao vencer com votação impressionante as eleições de 1982, montar os maiores palanques por eleições diretas e eleger Tancredo Neves. Finalmente, o “tempo de realização do mito” veio com a reconstrução democrática a partir das eleições constituintes de 1988, em que Iris consolida o comando da política regional, agregando outras marcas legendárias como ministro e como governador. 

Homenagens

Itami Campos - Sua atuação e carreira tornaram-no um político diferente, popular, atuante. Ele sempre se apresentava como líder de massa e com vínculo com o povo.


Pedro Célio - Vou arriscar três elementos fortes na trajetória de Iris. Primeiro a constância. Se tirarmos o período de afastamento devido à cassação, a ação de Iris esteve presente nas principais instâncias institucionais de Goiás, de maneira direta como governo ou como referência de oposição. De maneira indireta em vários municípios das diferentes sub-regiões. Em segundo lugar, a tipificação histórica de suas gestões, em que sobressai a instalação de infraestrutura no Estado. É uma história que só pode ser contada com lisura, se estiverem registrados os números de expansão das estradas asfaltadas e da rede hidrelétrica no território goiano. Em terceiro, o estilo centralizador que Iris manteve em sua atuação, tanto no governo, como no partido. Daí se originou a coleção de adversários de Iris, que cresceu em paralelo com o crescimento de sua base fiel.


                                                                                         Críticas de adversários 

Itami Campos - Recebeu críticas por pouco investir em educação, em saúde pública, em cultura. Também foi criticado por fechar espaços a políticos e lideranças que se destacavam, especialmente filiados ao PMDB, veja-se o ‘caso Henrique Santillo’, senador, desfilia-se do PMDB, filia-se temporariamente ao PT, retorna ao PMDB, após acordo regional. Também houve críticas de formação ‘panelinha política’ (Marconi Perillo, na campanha de 1998).


Pedro Célio - É necessário distinguir as críticas a Iris. Vejo aí um bom campo de pesquisas e tematizações. Há registros à direita e à esquerda com conteúdos totalmente diferentes. E há as acusações de ex-aliados, postados no mesmo campo (e estilo) ideológico-institucional de Iris. Pela esquerda, a grande reclamação define Iris como adversário dos movimentos sociais, avesso às suas demandas de autonomia e respeito a conquistas das categorias profissionais e ações coletivas. Tenho comigo que essa crítica procede em boa medida, podendo ser confirmada nas vezes em que Iris nega-se a negociar com sindicatos e movimentos por moradia e terra em Goiás. Por muitas vezes ele acaba acusado de agir como coronel, cacique e que só sabe se relacionar com demandas coletivas se exercer a cooptação. Pela direita, criou-se a “má-fama” de ser um político populista, que inclusive justificou a cassação em 1969. Para estes ele seria tendente a desorganizar as finanças públicas, a não honrar compromissos, a esmerar o culto à personalidade. Misturadas a estes dois grupos de crítica vieram os reptos de efeitos mais contundentes a Iris, desferidos por seus próprios parceiros transformados em desafetos. O de Iris ser ultracentralizador, autoritário na essência de suas concepções, narcisista, intolerante diante de discordâncias. De fato, podemos elencar com facilidade defecções fundamentais, no apoio a Iris, de lideranças marcantes, desde 1982: Mauro Borges e Derval de Paiva, Iram Saraiva, Irapuã Costa Jr., Daniel Antônio, Henrique Santillo e Nion Albernaz.

Maior marca das gestões

Itami Campos - Atendimento à demanda popular. Mobilização da população carente. Realização de mutirões com envolvimento da população do setor/bairro, construção de vilas e casas populares.


Pedro Célio -
Tocador de obras tornou-se a principal marca de Iris, em toda a sua carreira de homem público. Outras marcas fortes foram ocasionais, mais estimuladas pelo marketing do que uma característica de estilo ou personalidade. Por exemplo, a de populista. É verdade que Iris sempre buscou o contato direto com o eleitor, em detrimento de preocupar-se com promover o associativismo ou a organização popular. Mas o sentido clássico do populismo, de desmerecer instituições e ritos formais da democracia, nunca esteve no figurino de Iris. Ele sempre seguiu normas e regras partidárias, sempre levou a gestão das contas públicas com rigor. Nesse sentido, a competência organizacional pode ser citada como outra marca de sua liderança. No plano ideológico ele se guiou por preceitos conservadores, que privilegiavam a relação paternalista e individualista como mote da política. Como projeto de sociedade e de país, a sua mensagem impregnou-se desde cedo nas premissas do desenvolvimentismo e da função social do Estado, de proteção aos mais pobres.

Atuação no MDB

Itami Campos - A política goiana sempre foi expressão de dois partidos – da situação e da oposição; do pós-Guerra (1945) até 1965, intervenção militar e fim do governo Mauro Borges, PSD e UDN rivalizavam-se e tinham seus convenientes partidos aliados. Na redemocratização (1983) e até 1999, a polarização vai se dar entre MDB/PMDB versus Arena/PDS/PFL, também com composição de aliados. Nesta perspectiva, tanto Pedro Ludovico como Iris Rezende lideraram a política regional, com forte controle.


Pedro Célio -
A história de Iris traduz a história do MDB ou PMDB em Goiás. Ele nunca mudou de legenda, algo comum aos maiores nomes da política regional. Poucos sabem, mas na verdade sua origem é no PTB. Como vereador e depois prefeito eleito em 1965. O PDMB passou por muitas fases, transfigurando-se no sentido do partido da democracia, talvez até 1984/85, a um partido pragmático que a partir das eleições de 1986 passa a acomodar-se aos padrões da política tradicional brasileira, em que a construção de maiorias subordina os requisitos programáticos e ideológicos. Mais adiante, já no século 21, o PMDB mantém-se graças à força dos seus caciques regionais para sustentar estratégias fisiológicas no cenário nacional. O perfil de Iris Rezende acopla-se com exatidão a cada uma dessas fases.

Maior legado político

Itami Campos - Íris Rezende, mesmo tendendo ao liberalismo e ao conservadorismo, sempre se apresentou como um político popular, caminhando para o populista na sua forma de fazer política ou, pelo menos, no seu discurso político. Sua postura e atuação sempre foram pautadas na direção de propostas de construção e de obras que se apresentavam como demandas populares.


Pedro Célio - Iris expressa um tipo de político que não deixa legado na dimensão das ideias ou de uma organização que vise disputas estratégicas. A base de seu êxito no longo tempo sempre se fixou em sua própria figura, em seu desempenho pessoal no manejo do pragmatismo. Não encontramos nas suas ações e discursos um eixo conceitual ou uma visão da história. Para demonstrar essa percepção, basta ver que, hoje o MDB sem Iris age como um partido errático, sem bandeiras para a sociedade, para a economia, para a cultura. Os seus principais nomes, mesmo os mais jovens, professam um ideário restrito ao jogo eleitoral, pautado por estar na oposição ou na situação. Nada mais que isso. Para não conduzir a avaliação de Iris por um rigorismo total, podemos buscar dois pontos factuais em seu favor: um deles é listar as obras assinadas por Iris em Goiás; outro é o fato de que ele encerrou a carreira sem deixar pendências na Justiça, relacionadas a corrupção ou malversação de verbas públicas. Em essência pode ser pouco, pois esta deveria ser a obrigação de todo homem público. Mas nos nossos dias, acaba sendo algo que lhe permita reivindicar ser lembrado de maneira positiva.


Última entrevista

Política foi entrevistado pelo jornalista Jackson Abrão por meio de sua live no jornal O POPULAR


Expediente

Edição

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Fabrício Cardoso

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Marcos Bandeira

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Reportagem

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Fotos

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