Goiás está na rota do agrotóxico ilegal
Produtos vindos, principalmente, do Paraguai encontram na Região Sudoeste do Estado um mercado potencial. Só este ano, quase sete toneladas já foram apreendidas
O uso de agrotóxicos regularizados no Brasil já é complexo por si só, e o aumento de casos envolvendo a investida de contrabandistas e o possível uso de produtos falsificados ou sem autorização no País surge como um elemento a mais para complicar esse cenário. Em Goiás, a principal região que tem sido alvo da ação dos criminosos é a Sudoeste, onde o aumento de 27,2% das apreensões feitas este ano, em relação ao ano passado, sinaliza a crescente atuação de grupos e compradores de insumos de origem duvidosa. Ao todo, quase sete toneladas de agrotóxicos sem procedência, sem registro no Brasil, de efeitos e consequências desconhecidas foram recolhidas, desde janeiro, pelo Comando de Operações de Divisas (COD) nas rodovias que ligam as cidades de Rio Verde, Jataí e Mineiros.
A origem desses produtos é diversa, mas, geralmente, são fabricados na China e Índia, chegando à América do Sul pelo Paraguai, Uruguai e Bolívia. Pelas fronteiras, principalmente via Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, e Foz do Iguaçu, no Paraná, essas substâncias adentram o País e seguem destino aos principais polos do agronegócio nacional. Goiás, claro, faz parte da rota, não só pela localização, mas também pela importância da produção. A Região Sudoeste é uma das grandes produtoras de soja, milho e algodão do Brasil e exporta para diversos países da União Europeia e da Ásia, principalmente a China. Numa única apreensão feita em agosto deste ano, o COD encontrou em Rio Verde quase duas toneladas de um produto chinês, cujo uso é proibido no Brasil.
O que preocupa, para além dos efeitos desconhecidos no plantio, é o que a utilização desses produtos pode acarretar para a saúde de quem consome os alimentos. Em reportagem publicada pelo POPULAR em julho deste ano, especialistas refletiram sobre o quão recente ainda é a produção de pesquisas relacionando as substâncias químicas de uso autorizado no campo e os problemas de saúde, no Brasil. Em 10 anos, conforme dados do Ministério da Saúde, 6.142 pessoas foram diagnosticadas com algum tipo de intoxicação por agrotóxico em Goiás. Desde 2000, o Estado vem oscilando entre o quinto e o sexto maior consumidor desses produtos, no País. No ano passado, segundo dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), foram 43,4 mil toneladas vendidas em Goiás, um aumento de 224,5% em 17 anos (veja quadro na página 14).
Se os estudos não conseguem acompanhar o que já é de uso autorizado, não é exagero imaginar que pouco ou nada se sabe sobre os efeitos da utilização do que é contrabandeado e falsificado. O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) avalia que, atualmente, 20% do mercado de agrotóxicos no Brasil já são preenchidos pela venda de produtos ilegais. De acordo com o gerente de produtos do Sindicato, Fernando Marini, entre 2001 e 2016, foram apreendidas 1,1 mil toneladas de agrotóxicos proibidos, no País. Se tivessem sido utilizados, informa ele, 6 milhões de hectares e em torno de 15 bilhões de quilos de alimentos poderiam ter sido afetados.
Produtos falsificados não possuem nem rótulo
Identificar um agrotóxico falsificado ou contrabandeado não é tarefa difícil. Tudo começa pela existência ou não de um rótulo com linguagem em português. E mesmo sendo esta uma regra básica ainda é possível encontrar produtos que sequer trazem informações na embalagem. Isto foi identificado, por exemplo, numa carga apreendida em setembro deste ano em Rio Verde, no sudoeste goiano. A substância, que, segundo os suspeitos, seria utilizada na elaboração de um produto, foi encontrada em uma fazenda da região, dentro de pacotes prateados (foto) e sem nem rótulo capaz de identificá-la.
O produto segue retido na delegacia da Polícia Civil da cidade e o inquérito do caso já foi remetido ao judiciário. No local, os policiais do Comando de Operações de Divisas (COD), no momento do flagrante, encontraram, além do produto suspeito, galões vazios que serviriam, depois, para armazenar a substância final, cheques, uma quantia alta em dinheiro, equipamentos de pesagem e armas. “A ideia era embalar tudo e comercializar o produto falsificado”, relata o delegado Stanislao Montserrat.
A Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa), uma das responsáveis pela fiscalização do uso de agrotóxicos no Estado, orienta, para fins de identificação, que todo produto registrado no Brasil tem o rótulo e a bula autorizados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Ministério da Saúde e Ministério do Meio Ambiente em português. Se uma dessas condições não é percebida, a agência alerta para a necessidade de ficar atento ao comprar o produto. Na Região Sudoeste do Estado, por exemplo, foram encontrados produtos, cujos rótulos estavam em chinês.
“O que vem do Paraguai é tudo de origem asiática. O rótulo é indefinido. Muitas vezes, o próprio contrabandista burla a fiscalização, tira o rótulo original e coloca numa outra embalagem sem nenhuma característica e faz uma nova embalagem”, conta o comandante do COD em Rio Verde, tenente Flávio Borges. Outra questão diz respeito ao lacre dos produtos.
O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) orienta que é bom verificar se o lacre não está alterado e se a etiqueta está bem colada na embalagem. É importante se atentar ainda para as informações relacionadas à data de fabricação e de validade. A maioria das apreensões feitas pela Agrodefesa, em Goiás, é motivada pela identificação de produtos vencidos ou impróprios.